17.5.05

questionário

respondo ao questionário do momento a convite do meu amigo alexandre. (esta coisa anda em todo o lado, parece um vírus de contágio por amizade.)

não podendo sair do «fahrenheit 451», que livro quererias ser?
seria «a colher na boca» do herberto helder. não me custaria passar o dia a debitar aqueles poemas. na verdade, de vez em quando, pego no livro e leio-o em voz alta. se houvesse de participar no filme, fazendo esse papel, não precisava de muito ensaio.

já alguma vez ficaste apanhadinho por uma personagem de ficção?
os k do kafka são todos impressionantes. lembro-me de sonhar com vários (e com o gregor samsa) nos tempos em que li kafka em jeito de pão nosso de cada dia. um dia sonhei que o agrimensor do «castelo» falava comigo finalmente (eu seria k), e eu entenderia tudo o que me pedia e poderia concluir o longo romance. quando acordei não entendi se esqueci o que me disse, ou se sonhei apenas que me tinha dito sem de facto escutá-lo. fiquei triste. na inconsciência do sonho a felicidade era absoluta.

qual foi o último livro que compraste?
comprei a obra poética do luís miguel nava para oferecer ao poeta espanhol antonio gamoneda. falei longamente com o antonio sobre o nava, que ambos admiramos. ele tem vários livros do poeta português oferecidos pelo próprio, mas não vira ainda a edição da obra completa. o luís miguel nava é um dos meus poetas favoritos. não só o considero um dos três melhores poetas dos últimos trinta anos, como considero um dos mais poderosos da lírica portuguesa de sempre. pode fazer linha com pessoa, herberto, belo e daniel faria.

qual o último livro que leste?
li o novo da inês lourenço, «logros consentidos», numa edição belíssima da & etc. acompanho há muito o trabalho da inês – tive o prazer de editar a recolha da sua poesia nas quasi – e acho que ela acaba de publicar um dos seus melhores livros. estes «logros» são ainda mais distintos, no tom perspicaz e sem concessões que a autora sempre teve.

que livros estás a ler?
agora leio a peça de teatro do rui lage, «não há mais que nascer e morrer», com chancela das edições mortas; leio «no pino do verão», de paulo bateira, numa edição cosmorama, e «juxta crucem tecum stare», de manuel de freitas, numa edição da alexandria. são todos livros muito curtos, de modo que são as leituras do dia. peguei-lhes hoje um pouco à hora do almoço e devo retomá-los para terminar antes de dormir.

que livros (cinco) levarias para uma ilha deserta?
«a colher na boca», embora já quase não precise; «naked lunch», do william burroughs; «o castelo», do kafka»; «molloy», do beckett; «o retrato de dorian gray», do oscar wilde. por esta ordem. cada um destes livros é um tratado de estilo, marcando a extensão da escrita, a plasticidade das palavras, o quanto a humanidade se aumenta a partir da arte. concebo a arte um pouco a partir destes pilares; um espaço de invenção sem tréguas, ao mesmo tempo perto e longe da realidade. talvez, ao mesmo tempo, perto e longe da verdade.

a quem vais passar este testemunho (três pessoas) e porquê?
vou passar a três amigos com quem assino um outro blogue: o eduardo pitta, o joão paulo sousa e o jorge melícias.

3 comentários:

  1. Estas foram as respostas mais agradáveis e interessantes de ler (e olha que li muitas)!
    :)

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  2. obrigado. fico sensibilizado e vaidoso com o teu comentário

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  3. quando li sobre e de daniel faria (referido no quaestionário) achei que poedria ter sido um dos maiores poetas portugueses deste século.
    devemos-lhe (como povo) uma grande homenagem póstuma. ele ainda não foi nem reconhecido nem divulgado.
    poderia ter sido o nósso pessoa do novo século.

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